Após uma longa pausa hoje retomamos um segmento aqui no blogue: As Conversas de Mil Histórias. Um espaço de conversas sobre livros com diversos convidados.
O convidado de hoje é o Nuno Nepomuceno, autor dos livros A Célula Adormecida e da Trilogia Freelancer, composta por O Espião Português, A Espia do Oriente (opinião em breve) e A Hora Solene (opinião em breve).
Espero que gostem e que leiam os livros do autor Nuno Nepumoceno, pois valem muito a pena.
Jardim de Mil Histórias - O Nuno é formado em Matemática. Como surgiu esta
paixão pela escrita e por contar histórias?
Nuno Nepomuceno - Iniciou-se com a leitura. Por influência da
minha mãe, que sempre me incentivou a isso, acabei por crescer acompanhado por
livros. Os meus gostos foram evoluindo com a idade, claro. Recordo-me de ler
coleções como Os Cinco, Os Hardy ou Uma Aventura, que me eram oferecidas pelo Natal ou que ia
requisitar à biblioteca municipal. Gostava bastante de o fazer, de andar pela
rua com os livros na mão enquanto ia e vinha.
Depois, quando passei a ser financeiramente
independente, é que comecei a investir mais noutros géneros, como os thrillers. Houve um momento a partir do
qual, que não sou capaz de precisar com exatidão, em que comecei a sentir
curiosidade sobre como seria estar do outro lado, ou seja, ter o poder de criar
e manipular as personagens, entrando, assim, no imaginário do leitor. Hoje em
dia é isso que me motiva mais — a possibilidade de suscitar emoções em que lê o
meu trabalho.
J.M.H. - A trilogia “Freelancer” teve um grande impacto
nos leitores. Foi com a primeira parte, “O Espião Português”, que ganhou, em 2012,
o Prémio Literário Note!. Estava à espera desse reconhecimento?
N. N. - Eu já publiquei quatro livros e quer o processo, como
os resultados que obtive, foram diferentes em todos eles. É difícil dizer se eu
esperava ganhar um prémio revelação ou se aquele livro que eu tinha escrito
durante oito anos se tornaria num sucesso comercial. Quando concorri, quis
acreditar que sim, e quando O Espião
Português foi colocado à venda, desejei-lhe o melhor. Mas nunca se sabe
muito bem o que vai acontecer. O mercado livreiro não é tão previsível quanto
possamos pensar e, por vezes, há surpresas, sejam elas boas ou más. Eu
limito-me a ser otimista.
J. M. H. - O seu mais recente livro “A Célula Adormecida” desperta-nos para uma hipótese de ataque terrorista em Lisboa. Hoje em dia é uma hipótese bem real. O que pretendeu com esta história?
N. N. - Tive dois objetivos, essencialmente. O
primeiro foi provocar uma mudança na minha carreira. A trilogia Freelancer acabou por deixar uma marca
algo inesperada, sobretudo, devido ao carisma do protagonista, e eu quis
distanciar-me de tal, ou seja, mostrar ao meu público que sou um escritor com
mais do que uma dimensão e, através disso, cativar outros leitores. Daí A Célula Adormecida ser um romance bem
mais negro do que os anteriores que publiquei, assumindo-se claramente com um thriller psicológico e não tanto como um
policial.
Por outro lado, desejava abordar um tema que
julgo ser importante e que, infelizmente, começa a fazer parte da nossa vida
diária. Os grupos terroristas têm muitas nuances, estando, por vezes,
associados as outros fenómenos de forma mais ou menos direta. Foi assim também
que surgiu a ideia de abordar temas fraturantes da nossa sociedade, que com o
livro desejei colocar sob reflexão. Refiro-me aos movimentos migratórios, à
instabilidade no Médio Oriente, ao extremismo e radicalização da Europa, entre
outros. A mensagem final que tentei transmitir foi a de tolerância. Espero que
tenha chegado aos leitores.
J. M. H. - Nota-se nos seus livros um grande rigor factual,
histórico e social. Faz algum trabalho de investigação prévia?
N. N. - Sim, é algo que comecei a trabalhar logo com O Espião Português, mas que tem ganho
preponderância em todo o meu processo criativo com o passar dos anos. Procuro
ler sobre os temas que quero abordar, visitar os locais que escolho para a ação
dos livros, entrevistar especialistas ou até mesmo viver parte daquilo que desejo
descrever. Por exemplo, assisti a alguns serviços religiosos na Mesquita
Central de Lisboa durante o ano em que dediquei à redação de A Célula Adormecida. E isso acabou por
ser muito importante para mim, pois, enquanto estava lá sentado a observar em silêncio
as pessoas que rezavam, as ideias iam surgindo naturalmente.
J. M. H. - Quais
as suas grandes referências enquanto escritor?
N. N. - Em termos técnicos, não tenho ninguém. A escrita não
é estanque e há certas formas de o fazer que aprecio e outras que nem por isso.
Procuro escrever aquilo com me sinto confortável, incluindo as opções criativos
que tomo, não embarcando em modas ou fórmulas que se dizem ser extremamente
vendáveis na atualidade. Fora isso, há autores cuja carreira vejo como um
exemplo e cujos livros me dão bastante prazer. Posso citar os casos de Ken
Follet e Daniel Silva, se bem que existam outros. Já li excelentes obras fora
do registo policial.
J. M. H. - Em que é se inspira para escrever?
N. N. - É um processo misto. Tanto pode vir de uma
fotografia, como aconteceu com A Espia do
Oriente, ou através de uma canção, como foi o caso de A Hora Solene. Ou até um livro, no caso do conto « A Cidade», com o
qual integrei a coletânea Desassossego da
Liberdade. Mas tento manter um espírito aberto e ser recetivo a novos
elementos. Por vezes, as melhores ideias surgem de forma inesperada. De
repente, estou a escrever e é como se os dedos tivessem vida própria. Há uma
frase que surge sem ser planeada e que muda tudo.
J. M. H. - Ouvimos muitas vezes os autores afirmarem que o
processo de escrita concentra-se em 90% de trabalho e 10% de talento. Concorda?
N. N. - Eu gosto de pensar que tenho algum talento. Se assim
não fosse, não iria escrever, pois foi a vontade de mostrar aos outros o que
considero ser capaz de fazer que me levou a começar, independentemente do muito
ou pouco sucesso que viesse a ter. Mas tudo requer imenso trabalho e quando
começamos um livro é bom que estejamos cientes de que não vai ser fácil. Se a
memória não me falha, nunca escrevi um capítulo à primeira. Chego a revê-los
quatro e cinco vezes e até a reescrevê-los constantemente ou mesmo deitá-los
fora.
J. M. H. - Sente de alguma forma que a literatura
portuguesa não é tão valorizada face à literatura internacional?
N. N. - Existe algum desfavorecimento, sim, mas que penso
ter-se atenuado nos últimos tempos. Há autores portugueses que vendem mais em
alturas muito críticas, como o Natal, do que os escritores estrangeiros. Espero
que seja uma situação que tenda a continuar a evoluir de forma positiva no
futuro. Pelo menos, o passado recente dá-nos alguma esperança nesse sentido. Há
alguns anos, a ficção portuguesa debatia-se para competir com a norte-americana
ou brasileira e hoje em dia lidera audiências. O mesmo tem vindo a acontecer
com a nossa música. Nós temos uma relação algo curiosa com o que fazemos.
Julgamos sempre que é de qualidade inferior. O que nos chega de fora exerce um
grande fascínio sobre o consumidor. Resta a esperança que, à semelhança da
transformação que tem vindo a ocorrer noutros setores da cultura, o mesmo se
venha a suceder com a literatura nacional.
J. M. H. - Enquanto leitor o que gosta mais de ler? E o que
não gosta de ler?
N. N. - Aprecio essencialmente thrillers e policiais, com algumas incursões felizes pela fantasia
e romances históricos, mas ciente de que um bom livro deve ser lido e,
portanto, com abertura para as surpresas que poderão surgir. E não tenho nenhum
género, formato ou autor que me cause aversão. Ler faz parte da nossa vida.
Precisamos de o fazer diariamente.
J. M. H. - Qual o livro da sua vida?
N. N. - Os Pilares da
Terra, de Ken Follett, e Os Três
Mosqueteiros, de Alexandre Dumas. Adoro as épocas históricas em que
decorrem e admiro os autores pelo excelente trabalho que realizaram com os
livros. O Estranho Caso do Cão Morto,
de Mark Haddon, também é uma obra que me marcou muito, sobretudo, pela forma
criativa e sensível com que explorou o tema do autismo.
J. M. H. - Para quem não conhece a sua obra, e no sentido
de convencer o nossos leitores a ler os seus livros, qual deles define melhor a
sua escrita?
N. N. - Esta é uma pergunta muito difícil. Todos eles são
especiais para mim à sua maneira. Os primeiros porque não foi fácil
publicá-los, além de terem exigido um esforço considerável para os escrever, já
que não possuía qualquer experiência; os últimos porque
traduzem melhor a pessoa que sou hoje em dia. Prefiro que sejam os meus
leitores a decidir isso.
J. M. H. - Que projetos literários tem para o futuro?
N. N. - Neste momento, encontro-me a trabalhar em
mais um thriller psicológico, que,
apesar de ter alguns pontos de contacto com A
Célula Adormecida, não será sobre terrorismo, embora envolva de novo uma
grande dimensão cultural e religiosa, além de outros elementos que são
transversais ao meu trabalho, como aventura, romance, espionagem e alguma ação.
Estou numa fase importante do livro, mas algo
embrionária, ainda, razão pela qual não sei quando será publicado. Prefiro
levar o meu tempo e regressar quando me sentir preparado, quando tiver a
certeza de que este é o meu melhor livro até ao momento.
J. M. H. - Nuno, muito obrigada por esta entrevista.
N. N. - Eu é agradeço a oportunidade e convido todos os leitores a
continuarem a passear pelas mil histórias do seu jardim.
Adorei! Espectacular conhecer mais do Nuno e ver onde se inspirou. E ele fez muito bem em apostar na mudança com o seu último livro.
ResponderEliminarOlá Cláudia,
EliminarObrigada :) Sim, é tão bom ver o que vai na mente dos autores.
Beijinhos e boas leituras
Tenho “A Célula Adormecida” aqui por ler, estou muito curiosa. O autor parece extremamente simpático e acessível!
ResponderEliminarOlá Bárbara,
EliminarÉ sim, muito simpático e acessível. Gostei muito do "A Célula Adormecida".
Curiosa para saber a tua opinião.
Beijinhos e boas leituras
Uma entrevista mesmo muito boa, Isa! Parabéns!
ResponderEliminarAinda não li nenhum livro do Nuno, porque nunca me senti muito tentada a ler policiais e thrillers, mas já ofereci os 4 livros a alguém que sim, adora esses géneros.
Gostei de saber que partilha comigo muitas leituras infantis e o facto de a mãe ter sido a impulsionadora para que começasse a ler ainda pequenino!
Fico à espera de mais entrevistas, Isa!
Olá Ana,
EliminarSim, sei que não é o teu género. Mas ainda assim, se algum dia quiseres arriscar, experimenta :)
Muito obrigada :) Ainda bem que gostaste.
Beijinhos e boas leituras
Olá Isaura
ResponderEliminarAdorei ler a entrevista. Li a trilogia "Freelancer" e gostei bastante.
Beijinhos e boas leituras
Olá Sara,
EliminarObrigada. Li o "Espião Português" e estou a caminho da "A Espia do Oriente". Espero gostar como gostei do primeiro.
Beijinhos e boas leituras
Uma entrevista mto boa! Parabéns Nuno!
ResponderEliminarOlá Joana,
EliminarObrigada pelo comentário. Gostei muito de fazer esta entrevista.
Um beijinho e boas leituras
É bom ler aquelas perguntas que gostaríamos de fazer e quando estamos frente a fazer não conseguimos... Já tive o prazer de conhecer o Nuno, mas o meu bloqueio nervoso não permitiu aguçar a minha curiosidade, sendo assim gostei muito de saber que Ken Follett está nas suas preferências e que já está a "cozinhar" outro livrinho, sempre dentro do género que aprecio bastante...
ResponderEliminarAinda só li "o espião Português", comprei logo a primeira edição, não sei porquê, mas acreditava que o Nuno seria um autor a ter debaixo de olho... ;)
Apesar de não gostar muito de espionagem, fiquei presa ao livro e desejo ler a continuação em breve, até porque estou em pulgas para saber o que se segue... :)
Obrigado por esta iniciativa, beijokas para os dois...
Olá,
EliminarSim é verdade. Quando estamos frente-a-frente as perguntas vão-se :) com tempo conseguimos organizar as ideias.
Já li o "A Célula Adormecida" e "O Espião Português". E já vou a caminho do próximo :) Gostei bastante de todos.
Já estou curiosa com o próximo livro.
Beijinhos e boas leituras
Olá Isa,
ResponderEliminarExcelente entrevista. Adorei ficar a conhecer um bocadinho mais do Nuno ;)
Beijinhos e boas leituras
Olá Tita,
EliminarObrigada :) Gostei muito de fazer esta entrevista e de ficar a conhecer melhor o escritor Nuno.
Beijinhos e boas leituras
Fantástica entrevista! Gostei muito!
ResponderEliminarTenho "A Célula Adormecida" para ler cá em casa e depois de ler esta entrevista fiquei ainda com mais vontade de o fazer!!
Também gostei bastante do blogue!! Já a estou a seguir e fico à espera de mais "Conversas de Mil Histórias"!! :)
Beijinhos,
Carolina - http://leiturasdacarolina.blogspot.pt/
Olá Carolina,
EliminarObrigada pelo comentário :)
Bem-vinda :)
Recomendo "A Célula Adormecida". Um excelente livro. Estou a ler a trilogia do autor e vou brevemente iniciar o próximo "A Espia do Oriente". Depois partilho opinião.
Beijinhos e boas leituras
Já li a "A Célula Adormecida" e adorei. Livro simplesmente fantástico do princípio ao fim. Também gostei da "A Espia do Oriente". Parabéns ao Nuno e à entrevistadora que nos deu a possibilidade de conhecer um bocadinho mais do autor. Continuação de enormes sucessos.
ResponderEliminarOlá Cristina,
EliminarObrigada pelo comentário.
Gosto muito da escrita do Nuno e por isso a vontade de conhecer o autor melhor.
Em breve vou ler "A Espia do Oriente".
Beijinhos e boas leituras
Olá!
ResponderEliminarEu sou daquelas que está completamente rendida à escrita do Nuno, e no lançamento da "Célula Adormecida" tive o prazer de o conhecer. Infelizmente quando conheço pessoas que admiro muito acabo por ter a capacidade de comunicação de uma batata, então não consegui perguntar nada do que gostava.
Muito obrigada aos dois pela entrevista!
Olá!
EliminarSim, a escrita do Nuno é muito boa. Também estou rendida.
Como te compreendo. Só com calma e serenidade é que, por vezes, conseguimos estruturar bem as ideias :)
Obrigada pelo comentário.
Boas leituras.
Beijinho